A quantidade e a qualidade

Imagem aleatória

É comum encontrar, no universo dos otacos fedidos, um povo que o domina quase por completo. Tal povo se nega completamente a aceitar a inexistência da qualidade, principalmente no que se refere aos animes que costumam assistir, gostar e, por conseguinte, endeusar como algo perfeito; livre de todo e qualquer defeito. Curiosamente, nota-se que, em diversos casos, a qualidade do anime e a quantidade de pessoas que o endeusam é inversamente proporcional, ou seja, animes inegavelmente ruins que acabam atraindo um grande público, afinal, é sabido que não é necessário qualidade para atrair público. 

Ao serem confrontados com críticas, tal povo usa de toda a sua capacidade cognitiva e conhecimento da obra criticada para defendê-la e calar a boca daqueles que ousam a criticar ao reunir seus melhores argumentos e dizer: "É modinha falar mal de anime modinha." Bom, todos sabemos que só acéfalos usam tal argumento, então vamos deixar as brincadeiras de lado.

Dentre os endeusadores, há aqueles que são um tanto sagazes e criam uma argumentação que, ao ter um mínimo de sentido, consegue convencer aqueles que não entendem a jogada por trás. É um argumento fácil, onde a premissa maior cria uma conclusão quase que instantânea: "Se tantas pessoas gostam, como que esse anime pode ser ruim?" ou "Veja quantas pessoas falam bem, não tem como ser ruim." 

É normal ver tal frase em diversos debates de nível levemente superior aos em que seriam usados argumentos do tipo "Não existe anime ruim, apenas gostos diferentes." Alguns de seus usuários são os famosos autodenominados cultos ou críticos, cujo orgulho não permite aceitar o óbvio shit taste, por mais que gostar de uma obra ruim ou ter um gosto por animes ruins não seja, necessariamente, um problema.

Pois bem, devo parar com a enrolação e, finalmente, devotar-me a discorrer sobre tal argumento, que já fora exposto anteriormente, resumindo:

 "Se tantas pessoas gostam, então é bom."

Nesta frase, percebe-se uma clara correlação entre o "bom", que faz referência à qualidade, e a quantidade. Esta correlação, apesar de parecer fazer sentido, é incorreta, impossível.

Para começar, creio que devemos falar de uma frase normal em meios de trabalho, talvez seja um ditado popular: "Não queremos quantidade, queremos qualidade." O que isso quer dizer? Simples. Um grande número de indivíduos trabalhando em algo não é certeza de um serviço de qualidade. Ora, se colocarmos tal conclusão em nosso universo: Não importa quantos gostem; quantos estejam falando bem; quantos memetubers estejam postando vídeos; quantos estejam endeusando. Isso não quer dizer que tal obra é boa, ou seja, se for ruim, vai continuar sendo ruim, mesmo que tudo isso acima esteja acontecendo.

Ah, mas pode ser que o dito acima esteja muito bruto, que não seja o suficiente para compreendermos a falácia que é o argumento que deu origem a esta postagem, sendo assim, tal como a última do tipo, vamos mostrar como que tal correlação é incorreta.

A quantidade, ora, creio que seja intuitivo, trata-se de uma grande dimensão, um grande número.
Mostremos alguns exemplos da quantidade em casos distintos:
  • Há uma grande quantidade de pessoas que fumam cigarros;
  • Há uma grande quantidade de pessoas que usam carros populares;
  • Há uma grande quantidade de pessoas que gostam de Fairy Tail.
Agora, é o momento de introduzir tais casos em tal argumentação e discorrer sobre a qualidade de tais itens, desta maneira, vamos rever os mesmos exemplos de antes:

"Há uma grande quantidade de pessoas que fumam cigarros."

Não é necessário falar sobre isso. O cigarro possui mais de 5 mil substâncias tóxicas, nocivas e cancerígenas em sua composição, causa cerca de 50 doenças diferentes, entre elas, o câncer de pulmão, além de sua fumaça não ser nociva apenas ao fumante, mas a todos à sua volta. 

Mesmo assim, não importando o quão óbvio seja o fato do cigarro ser algo ruim, a industria continua extremamente ativa, ou seja, há necessidade de atender a grande demanda de fumantes. Tal como os fumantes, os endeusadores se negam a aceitar a qualidade negativa dos animes que endeusam ou, em certos casos, sabem que é ruim, mas se negam a aceitar e, como tentativa de justificar a qualidade, passam a forçar as razões pelo qual gostam da obra ruim, dos possíveis prazeres que proporciona.

"Há uma grande quantidade de pessoas que usam carros populares."

Nota-se que tipos específicos de carros são vistos com uma frequência maior nas ruas, isso, obviamente, deve-se ao fato de serem modelos mais facilmente vendidos. Por quê? Ora, por mais que seu desempenho seja inferior a diversos outros modelos de maior nível, seu preço permite que mesmo aqueles sem muita renda consigam comprar.

Mesmo assim, tais carros, geralmente, possuem curta vida útil, geram mais despesas com manutenção e, dependendo do tipo de motor, consomem mais gasolina. Muitas vezes, o famoso trio elétrico (alarme, levantadores de vidro e trava elétrica) não vem junto ao veículo e deve ser adquirido separadamente. 

Tal como visto nestes dois casos, podemos notar que, por mais que um grande número de pessoas sejam usuárias de um determinado produto, tal produto não necessariamente é bom. Compreendendo tais exemplos, vamos trazer isso para o nosso universo, ou seja, os animes.

Creio que já deve ser possível compreender o ultimo exemplo: 

"Há uma grande quantidade de pessoas que gostam de Fairy Tail."

O melhor cenário seria nem precisar falar algo aqui, pois, neste exemplo, peguei um dos piores shounens mainstream, caso não seja o pior. Um shounen, essencialmente, não possui um foco em ter um enredo decentemente construído. Shounens mainstream, em especial, são desprovidos de enredo e somente desenvolvem arcos cíclicos focados unicamente em manter as vendas. Ainda assim, em um universo desprovido de enredo, Fairy Tail consegue se destacar como um pedaço de bosta, digo, anime ainda inferior aos demais quando se trata de enredo. 

Fairy Tail simplesmente não desenvolve nada. O arco anterior não traz nada necessário para o arco seguinte, tudo é simplesmente esquecido e um novo antagonista aparece. O desenvolvimento de personagens, algo que até outros shounens mainstream têm a decência de desenvolver, é praticamente inexistente. Na primeira temporada do anime, os oito primeiros arcos são completamente inúteis para o desenvolver dos acontecimentos que convergem ao possível final do anime, o mais próximo de algo  minimamente necessário se dá em poucas menções ao Zeref, este que só aparece no nono arco do anime. A melhor parte disso tudo é que após o aparecimento desse personagem-chave, o arco seguinte é o famoso arco de torneio. Em outras palavras, se formos reunir todos os episódios que minimamente desenvolvem algo que não seja simplesmente um arco aleatório com um antagonista esquecível, não teriam nem mesmo vinte episódios úteis dentre os quase trezentos episódios do anime.

A animação é a parte mais decente do anime, deve-se agradecer por ter sido A-1 Pictures e não o Pierrot a adaptar tal obra. Imagine como seria ter que assistir algo cujo enredo e animação são igualmente ruins, um inferno, não?

Ainda assim, percebe-se que há uma grande quantidade de pessoas que têm coragem de falar que é bom, endeusar e forçar isso nos outros, não aceitando quaisquer criticas. Ademais, confirma-se que não há ligação entre qualidade e quantidade, se mesmo um anime tão ruim quanto Fairy Tail consegue atrair uma grande quantidade de fãs, então qualquer anime bosta consegue, ou seja, tal argumento é falho.

Essa tendência mostra o quanto tais indivíduos não possuem argumentos para defender a obra sendo criticada. Em vez de reunir argumentos, possíveis pontos positivos e entrar em um debate com aquele que critica, preferem usar alegações gerais e de se fácil uso para justificar um caso em específico.

"Ah, mas existem animes bons que são populares." Bem, isso é óbvio. A ideia não é forçar que todo anime popular é ruim ou que todo anime impopular é bom, mas sim mostrar que tal argumentação é falha como tentativa de defender a qualidade de um anime.

Steins;Gate, por exemplo, é um anime bom que é extremamente popular, você poderia, até mesmo, caso goste de rotular animes populares, chamá-lo de modinha. Ainda assim, não se percebe o uso desse rótulo em tal anime, sendo assim, qual seria a razão disso?

Simples. Um anime verdadeiramente bom não precisa de popularidade para se enaltecer, não precisa de popularidade como argumentação para defender suas qualidades. Em um debate sobre a qualidade de um anime bom, em nenhum momento você verá alguém argumentar sobre a popularidade do anime para tentar convencer de que é bom. Você verá argumentos embasados nos fatores específicos que determinam a qualidade de um anime, nesse caso, considerações sobre o enredo, desenvolvimento de personagens e suas profundidades, enfim, você notará que a discussão possui bem mais conteúdo e que aqueles que defendem a obra têm conhecimento de seus pontos positivos e negativos. Por outro lado, os endeusadores, que tentam enaltecer obras pela sua simples popularidade, na maioria das vezes, quando confrontados com a simples pergunta "por que é bom?" mal conseguem formular um argumento e há uma razão para isso: tal argumento, quase sempre, não existe. Não é possível citar concretos pontos positivos de um anime que não os tem e, claro, nesses casos, forçar algo sobre o quão possivelmente o anime é "foda" por simplesmente ter lutas é de cair o ânus da bunda.

Esta é a segunda postagem desta série, caso não tenha lido a primeira, veja aqui. Bem, quando se trata de enganos sobre a compreensão do que é a qualidade ou sobre os argumentos que muitos usam para tentar defender animes ruins, há muito para ser dito, posto isso, em breve haverão novas postagens do tipo. Fique de olho.

Por fim, não há problema em gostar de um anime ruim. Se você gosta de Fairy Tail ou de qualquer outro anime ruim, é a sua preferência, mas, se realmente gosta, é necessário que reconheça os defeitos/qualidades do anime e não fique endeusando determinadas obras. Isso é necessário para que não ocorram rages desnecessários quando estiveres discutindo um anime ou lendo reviews.


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